TÉDIO E CONFINAMENTO
Meu coração ridículo e frágil
Grita sem ter voz
Num mudo silêncio
E porque ninguém o ouve,
Convoca-me à tristeza
De viver entre o fogo da desilusão,
As cinzas da alegria
E a inconformidade que dói,
Porque meu coração
É menor que tudo no mundo,
Ele precisa de todos,
Depende de todos
E no amor!…Ah!…No amor,
É um poço que não tem fundo.
Sinto-me exausta de mim mesma,
Do isolamento em casa confinada
Imposto por quem tudo pode
Às gentes do meu país,
Para se vencer o COVID,
Retiram-lhe a liberdade,
A liberdade que sempre quis.
Estou exausta de cansaço,
De toda a escuridão que me envolve
E das vidas que partem sem amparo
À espera nas filas dos hospitais,
Estou exausta da luta infinda
De deixar passar os dias
Na incerteza da sobrevivência
E com medo de contrair a doença,
Estou exausta da solidão,
Exausta do barulho dos vizinhos,
Exausta de olhar pela minha janela
O voo dos passarinhos,
Exausta do silêncio de quem não me vê,
De quem não me procura,
Exausta de não ver ninguém
E de não ser vista por alguém.
São dezoito horas!…
E já começa a escurecer o dia,
Ninguém bateu na minha porta
E o telefone também não tocou,
A sombra da noite
Começa a abrir os braços
Para deixar entrar a lua,
As estrelas e o luar,
Tenho um desejo imenso
De retirar a máscara do meu rosto
Que me oculta o sorriso,
Silencia-me a voz,
Não me deixa respirar
E nem de sorrir ao vento
Com meus lábios desnudados
De sorriso franco e rasgado,
Tenho o desejo de ir para a rua
De olhar a vida a fervilhar
E nos jardins ver as plantas vivas
Ao vento a dançar,
De ver as flores de várias cores
A colorirem os canteiros
E a perfumá-los com odores.
Tenho um desejo enorme
De ver a luta diária,
De ver as pessoas nas ruas
A correr ou devagar,
As pombas a voar no Céu
E em terra a fugirem das gaivotas,
Ou a competirem na relva
Com os irrequietos pardais,
De ver os cães a correr
Pisando as folhas semi secas,
Barulhentas e coloridas
Com as lindas cores outonais.
Tenho saudades de libertar
A minha alma inconformada
E de a deixar voar até ao infinito,
Tenho saudades de ver as árvores
Erguidas, aprumadas, altivas,
Desfolhadas e nuas,
Tenho saudades daqueles
Com quem eu cruzava
Os meus passos nas ruas.
Que triste forma de vida
É esta de se viver!…
A melancolia se acoita
Nas nossas entranhas
E nos convida a sofrer.
Precisamos de carinho,
De abraços, de sorrisos,
Da convivência e dos afetos,
Para vivermos a vida…
A vida que ainda nos resta.
18 - 02 - 2021
Poema de Maria Judite de Carvalho
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